Ai vai, mais um
post da Ana Raquel Périco Mangili, lindo, vale a
leitura!!!!!!!!!!!!!!!
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“Ouvindo
contos infantis
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Branca de
Neve e os Sete Anões foi um filme que marcou a minha infância. Até hoje não sei
explicar o motivo de tanta fascinação infantil, que fazia a pequena Ana
assisti-lo quase diariamente. Meus pais reviravam os olhos e exclamavam “Mas de
novo?” a cada vez que ouviam a fita VHS sendo rebobinada no videocassete da
sala. E minha imaginação voava solta ao pegar o conjunto dos bonequinhos dos anões e da princesa, em vinil, para brincar.
Porém,
antes dos meus nove anos, ninguém (e nem eu mesma) suspeitava de minha surdez.
Eu ainda não usava meus aparelhos auditivos, e os desenhos animados não
possuíam a opção de Closed Caption. Somente com a descoberta de minha perda
auditiva é que comecei a assistir filmes e animações com legendas, e finalmente
percebi que estava perdendo muitas informações sonoras ao utilizar apenas meu
sentido da audição.
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O tempo passou, eu
cresci, minhas fitas VHS foram dadas embora, mas nunca esqueci a influência da
história da princesa e dos anõezinhos sobre mim. E, dia desses, uma reflexão
sobre contos infantis com minha irmã provocou uma curiosidade crescente em mim.
Como ainda me lembro de cena por cena do filme, nomes e ordem exata dos sete
anões indo em fileira para casa, se faz mais de dez anos que não vejo esse
filme? E o detalhe: eu o via sem legendas, algo considerado hoje por mim uma
prática impossível e aterrorizante, ver uma história na tela e só conseguir
pescar algumas parcas palavras por vez! Será mesmo que me lembro de tudo
exatamente como era, apesar de ter adquirido essas informações através de meu
fraco sentido auditivo?
Então,
um impulso me dominou noite passada, durante minha ida à locadora da cidade.
Fui até a seção dos filmes infantis em DVD e encontrei o que estava procurando
inconscientemente. E, dessa vez, eu poderia optar por assisti-lo legendado. Não
tive dúvidas: aluguei-o junto com outro filme que também escolhi.
Antes
de por o DVD no aparelho da sala, já estava preparada com uma expectativa
mediana. “Se o filme confirmar, em minha memória, que me lembro de pelo menos
uns 40, 50% de informações corretas, principalmente os diálogos entre os
personagens, já ficarei contente”, pensei. Ao começar a assisti-lo, tive uma
grande surpresa! Bem mais da metade das falas me trazia uma sensação de déjà
vu. Eu as lia através das legendas e tinha a sensação auditiva de já tê-las
ouvido antes. Poucos foram os diálogos que me soaram estranhos, havia uma
coesão próxima da totalidade dos discursos que ouvira perfeitamente há mais de
uma década, sem legendas, aparelhos auditivos ou leitura labial na ocasião.
A
única exceção se deu nas músicas, obviamente por elas exigirem uma habilidade
auditiva maior do que as usadas para compreender os diálogos. O que antes era
para mim apenas melodias e palavras indistinguíveis, agora com as legendas pude
finalmente entender as letras das canções da Branca de Neve e dos sete anões. E
confesso que elas me decepcionaram um pouco, porque talvez eu esperasse letras
mais elaboradas e tenha esquecido que este é um filme para crianças.
Esta
experiência me fez refletir sobre a capacidade de resiliência das crianças com
surdez. Minha perda auditiva é estável desde a infância, e de grau moderado,
mas se acentua muito nas frequências sonoras da fala, de modo que eu raramente
consiga acompanhar um diálogo sem o apoio da leitura labial, mesmo utilizando
aparelhos. Então é óbvio que eu não compreendi de primeira todos os diálogos do
filme quando era pequena. O que explica os grandes resultados de hoje com
certeza foi a minha busca inconsciente de adaptação. Um comportamento normal da
criança se fixar em um desenho e assisti-lo várias vezes, para mim adquiriu
também outro sentido. Mesmo sem saber sobre a minha surdez, eu buscava
compensá-la vendo repetitivamente a mesma história até minha audição captar a
maioria das palavras, e também lendo os livros de contos infantis e conhecendo
os vocábulos através da escrita.
A
surdez não tem o poder de nos impedir totalmente de desfrutar e possuir
lembranças calorosas de nossas infâncias. É o que prova o bonequinho do
anãozinho Dunga guardado até hoje em meu baú cor-de-rosa.”
Ana Raquel Périco Mangili.
Obrigada Ana, uma
bela reflexão!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Até
mais,
bjo,
Carol
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